"Porque foi para isto que morreu
Cristo, e ressurgiu, e tornou a viver, para ser Senhor, tanto dos
mortos, como dos vivos." Romanos 14:9
Frequentemente, ouvimos dizer que Jesus
morreu para nos salvar. De acordo com o registo bíblico, esta
afirmação é verdadeira. De facto, ao morrer na cruz sem ter
cometido qualquer pecado (Hebreus 4:15), Jesus pagou uma dívida que
não era sua (Romanos 3:23). Pode-se dizer que Jesus adquiriu, assim,
um "crédito" que fica ao dispor de todo aquele que
depositar a sua fé nele (Romanos 3:26). Ou seja, a justiça que
Jesus conquistou na cruz, é imputada aos pecadores culpados que
creem nele (Romanos 4:23-25). Esta imputação é identificada na
Bíblia como sendo a justificação (Romanos 3:24). Isto é, pessoas
culpadas (por causa dos seus pecados) que mereciam a morte
(afastamento eterno de Deus) passam a ser vistas, pelo Juiz, como
justificadas, mediante o pagamento efetuado por Jesus, e deixam de
estar condenadas (João 5:24).
Porém, esta explicação jurídica não
esgota a dimensão do que Jesus realizou na cruz. De acordo com o
texto de Romanos 14:9, o objetivo de Jesus, ao morrer e ressuscitar,
foi o de ser o Senhor de todos. A salvação que Jesus conquistou na
cruz, portanto, não pode ser dissociada do senhorio de Cristo.
Existem várias ilustrações que
procuram ajudar a compreender o milagre da salvação que Jesus nos
confere. Uma das mais frequentes será, porventura, a do
nadador-salvador que, perante a situação de uma pessoa em perigo no
mar, prestes a sucumbir ao vigor das ondas, prontamente a socorre.
Esta ilustração enfatiza o desespero de alguém prestes a morrer
afogado, estabelecendo paralelismo com o nosso estado desesperante de
morte espiritual por causa dos nossos pecados. No entanto, a imagem
peca por defeito (como, aliás, todas as que conheço) ao traduzir a
noção de que ser salvo é, simplesmente, ser retirado de uma
situação de perigo iminente para uma situação de segurança.
Pessoalmente, prefiro a ilustração do
comprador de escravos. Nesta, somos representados pelos escravos
comprados por Jesus que nos liberta de uma situação de escravidão
e que, por ter pago o preço da nossa libertação (I Coríntios
6:20; I Pedro 1:18-19), passa a ser o nosso novo Dono e Senhor.
Apesar das limitações que também esta ilustração apresenta,
parece-me que perspetiva melhor a mudança drástica que ocorre na
nossa condição espiritual: a salvação não é uma mera libertação
de uma situação de perigo; é uma mudança completa e absoluta de
propriedade (Colossenses 1:13). Aliás, diria que só somos salvos se
Jesus passar a ser o nosso Senhor! É o facto de nos tornarmos sua
propriedade que nos garante, não só a salvação, como também, a
própria preservação dessa salvação (João 10:28). Ou seja, o
sacrifício que Jesus realizou na cruz não é uma simples bóia de
salvação, mas é o pagamento através do qual ele adquire a vida
daqueles que nele depositam fé.
Em alguns ambientes religiosos,
assistimos à propagação da mensagem de salvação em Jesus, como
se tratasse simplesmente de alguma coisa boa que precisamos receber.
Este ensino não está errado, só por si. Mas não contém toda a
verdade. Talvez com a preocupação de simplificar a apresentação
da salvação, para promover uma maior aceitação, corre-se o risco
de diluir o próprio Evangelho. O grande perigo é que um Evangelho
diluído, rapidamente transforma-se noutro evangelho, distinto do que
é apresentado na Bíblia e ficamos perante algumas inquietantes
questões:
- Quem responde positivamente a um evangelho assim, será que entende o que está a fazer?
- Será que entende que está a entregar a sua vida a Jesus?
- E se não entende que é isso que está a acontecer, será que, efetivamente, isso está a acontecer?
- Será que é possível aceitar Jesus como Salvador quando não se tem a mínima ideia de que ele passa a ser o dono da nossa vida?
- Será que é possível aceitá-lo somente como Salvador e, só posteriormente, aceitá-lo como Senhor?
Fundamentalmente, julgo que não nos
podemos permitir ao facilitismo de apresentar a salvação meramente
como algo que se recebe (a tal libertação de uma situação de
perigo). Antes, julgo ser muito mais consubstanciado pelo registo
bíblico a apresentação da salvação como o resultado da entrega
da nossa vida a Jesus, reconhecendo-o como Senhor e Salvador: "se
com a tua boca confessares Jesus como Senhor, e em seu coração
creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo"
(Romanos 10:9). Paulo e Silas apresentam a salvação ao carcereiro de Filipes nestes termos: "E eles disseram: Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo, tu e a tua casa." (Atos 16:31). Igualmente, textos como João 1:12, este referindo-se
ao ato de receber Jesus, não podem ser dissociados do ensino
de que receber Jesus não é o mesmo que receber a ajuda oportuna de
um nadador-salvador, mas sim, de um Senhor e Rei que irá exercer a
sua autoridade na nossa vida (Mateus 6:10).
A apresentação da mensagem da
salvação não pode ser comprometida por qualquer artifício que
oculte, diminua ou dilua uma destas duas dimensões de Jesus:
Salvador e Senhor. De acordo com o registo bíblico, estas duas
facetas não são sequer desagregáveis. Nem podemos franquear a
ideia de que a sua aceitação pode ser opcional ou temporalmente
desfasada.
SALVAÇÃO é a entrega incondicional
da nossa vida ao Único que, não só adquiriu o crédito necessário
para o pagamento integral da nossa dívida, como tem todo o poder e
autoridade para a preservação da nossa salvação. É, portanto, a
aceitação de Jesus não só como Salvador, mas como o Senhor da
nossa vida.