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Arrependimento e confissão


O ser humano tem propensão inata para encontrar os seus atributos positivos. É uma questão de sobrevivência. Sem autoestima, sem capacidade de pensarmos bem de nós próprios, não nos moveríamos, nem teríamos confiança para enfrentar a vida e os seus desafios. Mas o pecado corrompeu o coração do homem. De maneira que características como esta foram deturpadas e levam-nos ao limite da idolatria do eu: “Eu sou bom. Por vezes falho, mas ninguém é perfeito. Olho à minha volta e percebo que, afinal, há outros bem piores. Tenho melhorado muito enquanto pessoa. Tenho muito para dar.” Esta atitude reflete-se no relacionamento com Deus: enumeramos os nossos méritos pessoais e ficamos convencidos de que Deus deveria estar muito satisfeito connosco. Sim, afinal, vamos à igreja; cantamos com entusiasmo; de vez em quando oramos; às vezes lemos a Bíblia; e, pasme-se, até contribuímos para a obra. “Deus deve estar muito contente por me ter na sua igreja”, pensamos.
Ao mostrar um povo arrependido, profundamente consciente da sua humilhação, confessando voluntariamente o seu pecado, o capítulo nove de Neemias constitui uma preciosa lição acerca do efeito da Palavra de Deus na perceção que temos acerca de nós próprios. A sequência dos acontecimentos não é fortuita: no capítulo anterior, o povo tinha ouvido atentamente a leitura da Lei. E como nos faz falta esta disciplina espiritual! Estar ligados à Palavra de Deus, genuinamente submissos e sensíveis ao que ela nos diz acerca de Deus e da sua vontade. Tal como Isaías contemplou a glória do Senhor e não pôde senão reconhecer a sua pecaminosidade, precisamos comparar a nossa vida com a perfeição divina, para percebermos quem, na realidade, somos! A justiça dos teus testemunhos é eterna; dá-me inteligência, e viverei.” (Salmos 119:144)
O momento de confissão terá durado, pelo menos, três horas. Essencialmente, quatro elementos fizeram parte desta confissão: as obras de Deus, a natureza de Deus, a resposta humana e as respetivas consequências. O povo relembra sistematicamente as obras grandiosas de Deus, desde a criação, a eleição de Abraão, incluindo situações da vida do povo em que Deus agiu com proteção, libertação, orientação, providência, liberalidade e vitória. Todas estas ações resultam, como também fica claro a partir do texto, da própria natureza de Deus. O povo enumera diversos atributos divinos, como a sua justiça, retidão, bondade, grandeza, soberania, clemência e, pelo menos por seis vezes, a sua misericórdia.
E não fosse a misericórdia divina, tudo estaria perdido, uma vez que a resposta humana a tudo o que Deus é e faz, não vai além de rebeldia, rejeição, desobediência, insubmissão e desprezo. O povo adquiriu consciência de que a razão para não terem sido completa e absolutamente destruídos tinha sido somente a misericórdia de Deus. Nada nas ações humanas poderia justificar a sua mera existência.
Esta é, também, uma realidade que precisamos compreender. Conforme a Palavra diz claramente, a sua misericórdia é mesmo a única razão para não sermos consumidos. É que, ao contrário do que gostamos de pensar, somos naturalmente rebeldes e, por isso, não nos sujeitamos a Deus, não o ouvimos e rejeitamos a sua Palavra. E, quando olhamos para nós à luz da natureza perfeita de Deus, essa perceção fica mais clara. “Deus providencia, mas ainda assim ando ansioso pelo dia de amanhã. Deus perdoa, mas ainda sinto o peso da culpa pelo meu pecado. Deus é justo, mas prefiro tomar a vingança nas minhas próprias mãos. Deus é libertador, mas prefiro resolver os meus problemas com o recurso à mentira e ao engano.”
O quarto elemento – as consequências das nossas ações – é muito importante. Nos versículos finais, lemos acerca de opressão que outros povos infligiram sobre o povo, por causa do seu pecado e transgressão, de maneira que o povo ficou em grande angústia. Quantas angústias temos vivido devido ao nosso pecado? É verdade que nem todas as dificuldades que se abatem sobre nós são resultado direto do nosso pecado. Mas todo o pecado acarreta destruição. Não é possível ter o pecado como um passageiro habitual e esperar que isso não seja arruinador para a nossa vida e para as vidas dos que nos rodeiam. Perceber esta realidade é o primeiro passo para uma vida comprometida com Deus e com a sua vontade. É isto que o povo pretende fazer, ao indicar que será assumido um compromisso público de obediência a Deus: “fizemos uma firme aliança, e o escrevemos; e selaram-no os nossos príncipes, os nossos levitas e os nossos sacerdotes” (versículo 38).
Que o Senhor nos ajude a desenvolver uma consciência clara em relação à nossa necessidade de perdão e que essa consciência resulte em genuíno arrependimento e confissão.

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