Custo de vida
extraordinariamente inflacionado, juros altíssimos, exploração
imobiliária e pobres completamente desprotegidos; propriedades a ser
hipotecadas e vendidas para pagar dívidas, dinheiro a faltar para
alimentos e impostos; povo a recorrer a empréstimos para as
necessidades essenciais.
No quinto capítulo do
livro de Neemias é descrita a exploração de que os pobres eram
alvo, por parte dos mais ricos e poderosos. Era tal a crise económica
e social que, para pagar dívidas, já algumas famílias haviam
vendido suas filhas como escravas, sem quaisquer perspetivas de poder
considerar o seu futuro resgate. O povo reportou a situação a
Neemias. A sua forma de agir constitui um paradigma para a igreja
hoje.
Em primeiro lugar,
lemos no versículo 6 que Neemias ouviu estas queixas e indignou-se
muito: “Ouvindo eu, pois, o seu clamor, e estas palavras, muito
me indignei”. Indignou-se não com facto de o terem incomodado
com os seus problemas, mas com a realidade que o seu povo estava a
viver. Neemias demonstrou uma sensibilidade para com os
problemas dos outros que nos serve de exemplo. Precisamos permitir
ser incomodados com o sofrimento alheio. Não podemos continuar a
nossa vida, voltados só para nós próprios, consumidos nas nossas
próprias preocupações e focados no nosso umbigo. Em vez disso,
necessitamos abrir os nossos ouvidos, olhos e corações à dor e
aflição dos que nos rodeiam, mesmo quando nós lutamos com as
nossas próprias dificuldades.
De seguida, no
versículo 7, Neemias confronta os ricos e poderosos, para denunciar
a sua injustiça: “Considerei comigo mesmo no meu coração;
depois pelejei com os nobres e com os magistrados, e disse-lhes: Sois
usurários, cada um para com seu irmão”. Este é um papel que
pertence à igreja. A igreja precisa ter uma voz clara e
determinada, na denúncia da injustiça e na defesa dos mais
desfavorecidos. Todavia, pensar na igreja não é sinónimo de
pensar numa instituição, organização, estrutura ou numa qualquer
entidade composta por alguns líderes. Fazem parte da igreja todos os
que já se arrependeram e confiaram em Jesus como seu Salvador. A
responsabilidade de denunciar a injustiça é de cada um de nós. Não
só de denunciar a injustiça, como de anunciar a justiça; isto é,
proclamar e, acima de tudo, viver a retidão de Deus; ser, afinal,
“sal da terra e luz do mundo”!
No versículo 8,
Neemias acrescenta a referência de ter resgatado alguns judeus que
haviam sido feitos escravos: “Nós resgatamos os judeus, nossos
irmãos, que foram vendidos às nações, segundo nossas posses; e
vós outra vez venderíeis a vossos irmãos, ou vender-se-iam a nós?”
Com as suas posses, comprou-os de volta para a liberdade. A
igreja também tem a responsabilidade de anunciar a libertação para
os cativos. E, de todas as formas de cativeiro, a crise económica
não é a mais grave. Por muito difíceis que possam ser as
circunstâncias da nossa vida, sem emprego, sem dinheiro, sem comida,
sem esperança de melhorias, com dívidas e, muitas vezes, também
sem saúde, esse não é o maior cativeiro, nem a maior opressão. A
verdadeira prisão é a que o pecado impõe sobre a nossa vida.
Resolver todas as crises e não ser liberto do cativeiro do pecado é
o mesmo que não resolver nada. Lembra-nos de todos aqueles que foram
alimentados por Jesus e que o abandonaram, no final. O custo da nossa
libertação já foi assumido por Jesus na cruz. Enquanto não há
genuíno arrependimento pelo pecado e verdadeira fé na pessoa de
Jesus, não há libertação do cativeiro e da opressão.
Depois de confrontar
os poderosos com a exploração que estavam a impor sobre os mais
pobres, Neemias desafia-os a assumirem um compromisso público de que
tal não voltaria a acontecer: “Então disseram:
Restituir-lhes-emos, e nada procuraremos deles; faremos assim como
dizes. Então chamei os sacerdotes, e os fiz jurar que fariam
conforme a esta palavra” (versículo 12). Nós também,
precisamos ser desafiados e desafiar a estabelecer compromissos de
obediência e fidelidade à vontade de Deus. Sem compromisso, não
há crescimento; não nos desenvolvemos, não amadurecemos. Na
realidade, preferimos sempre receber as bênçãos de Deus do que os
seus mandamentos. Queremos receber, mas não queremos dar; queremos
os benefícios, mas não a responsabilidade; queremos a satisfação
das nossas necessidades, mas não estamos interessados em mudar de
vida. Tratamos Deus como se fosse um extintor. Quando há fogo,
recorremos a ele. Quando não há fogo, prendemo-lo a uma parede, num
lugar acessível, mas que não nos incomode; não estamos
interessados em que interfira na nossa vida.
Finalmente, Neemias
descreve a sua decisão de, ele próprio, não colocar mais carga
sobre o povo: “Também desde o dia em que me mandou que eu fosse
seu governador na terra de Judá, desde o ano vinte, até ao ano
trinta e dois do rei Artaxerxes, doze anos, nem eu nem meus irmãos
comemos o pão do governador” (versículo 14). Ao prescindir
do que era devido ao governador, ainda que esse fosse um pleno
direito seu, Neemias mostra-nos que a nossa vida deve ser
exemplar, um modelo que outros possam seguir e imitar. Infelizmente,
na maior parte das vezes, em vez de abdicarmos de direitos nossos, em
favor do nosso próximo, estamos prontos a exigir até o que não
temos direito. Procurar viver uma vida exemplar não é fácil, mas
como igreja temos essa responsabilidade. Se nos afirmamos como o
Corpo de Cristo, precisamos ter presente que seremos o único Jesus
que as pessoas ao nosso redor vão poder ver, mesmo em tempos de
crise.